Há quem diga que eu gosto de
problematizar tudo, já eu fico super orgulhosa de mim cada vez que escuto isso,
porque sei que estou de alguma forma contribuindo para o crescimento crítico
meu e das outras pessoas. Pois bem, lá vai mas uma problematização.
Participei recentemente de uma
formatura de graduação lindíssima, onde a turma que se formava era composta
somente de mulheres. Que avanço, não?! Senti no peito um profundo orgulho em
saber e comprovar o quanto as mulheres vêm avançando no mundo, nas profissões,
no mercado de trabalho e ver que a cada dia mais mulheres se antecipam e se
tornam protagonistas das suas vidas. Pois bem, foi um momento maravilhoso, mas
fiquei muito inquieta em vários momentos do evento por um motivo: a falta da
flexão para o gênero feminino nas falas.
Desde o início do evento, tanto
as falas do cerimonialista, quanto os discursos e falas gerais pareciam
esquecer que a turma era formada somente por mulheres. Falavam “os formandos”,
“todos vocês”, “cada um” e por aí vai. A cada vez que se referiam a turma no
masculino eu falava pra minha mãe, que estava do meu lado “MAS SÓ HÁ MULHERES
NESSA TURMA!”. Vez ou outra, alguém acertava e/ou se corrigia ao perceberem
esse detalhe, mas no geral, mais se falou delas no masculino do que no
feminino.
Pode ser que alguém ache isso uma
besteira, e ache que eu me incomodo demais e vejo machismo em tudo. Mas é isso
mesmo, eu me incomodo, e sim, há machismo em tudo. Já outras pessoas dizem que
“o mundo tá ficando chato” a cada vez que chamamos atenção para essas questões.
Se para o mundo ser legal ele precisa ser preconceituoso e injusto, eu prefiro
mesmo que o mundo seja chato e livre de preconceitos e injustiças.
Eu penso que, sim, nós mulheres
já conquistamos muito, mas que ainda há muito o que se conquistar, e é através
dessas pequenas coisas que a gente vai conseguindo construir um mundo com mais
equidade de gênero, mais respeito e que realmente pense sobre causas como essa
de maneira consciente.
A flexão de gênero é algo de
extrema importância porque é através dela que, nós mulheres, nos fazemos
visíveis nas falas, na escrita e nas histórias contadas. Muita gente deixa de
usar por considerar que o texto fica “pesado” ou “cansativo”, e sim, eu concordo,
mas enquanto não existir outro meio de nos fazermos existir e sermos vistas,
vamos ter que nos utilizar desta maneira. É o que temos.
Fatos como esse da formatura
acontecem o tempo todo, e a construção do vocabulário tem grande culpa nisso. O
vocabulário é feito por uma sociedade, e quando a sociedade é racista,
machista, misógina e cheia de outros preconceitos, é de se esperar que o
vocabulário carregue também essas características. Mas assim como estamos
conseguindo avançar nas diversas áreas da sociedade e do conhecimento, é
possível também avançar e modificar essas construções culturais e conceituais
existentes.
Lembremos que o português é uma
língua viva e que está em constante transformação, e que se for preciso
reforma-la, façamos esta reforma.
E é por isso que é importante a
existência de gente pra problematizar o que não tá certo, pois só assim a
discussão é colocada em pauta e tem a oportunidade de amadurecer e gerar frutos
positivos através da transformação social e cultural. Que fiquemos atentas e atentos.
O mundo pode melhorar sim, e a transformação se faz primeiro na consciência de
cada um e de cada uma.
Por Aline Nobre
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